As veias do jardim da sereia


Em frente a minha casa, nas laterais da imaginação, tem um jardim florido e frondoso, repleto de segredos e sereias. Eu nunca atravessei as veias deste jardim imenso, sem que me conquistassem as flores e sem que o imaculado silêncio de verdes curvas me tocasse. Na extremidade do jardim, numa das entradas pra seu coração, há uma biblioteca municipal, também repleta de segredos e sabores. Há no canteiro do arco inicial uma senhora que gosta de entoar velhas canções de casamento sempre que me vê chegar, letras tão tristes quanto suas sandálias amarrotadas. Há bem ao longe, embora ainda no corpo do jardim, um pássaro muito do brasileiro assobiando para gajas e gajos que trafegam, escondidos e misteriosamente envolvidos em suor, capa e batina. 

Eça de Queiroz, que habita próximo a minha sacada, deixou como oferenda seus versos mais íngremes, daqueles que provoca no ouvinte a bravura e surpresa de empunhar sua espada para se defender do tédio.

Há também no silêncio negro do colorido jardim, certa simpatia por encontros. No que me sentava no aconchegante banco de pedra ao pé de sua tímida lagoa, observando as paisagens fabricadas do sexo entre a natureza e o tempo, bastava sentar que essa atmosfera se incumbia de me apresentar alguém inesperado. Um padeiro, um juiz, uma maquinista de trem elétrico, uma dançarina de tango, tudo a partir da mais bela espontaneidade que este jardim assedia em nós.

Este Jardim, o da sereia, que fica nas laterais da minha imaginação, tem veias que se ramificam pra toda Coimbra dos amores. Essas veias nunca secam. E seu sangue inuda e invade nossas mentes e corações.

(Bruno Silva, abril de 2014)

1 comentários:

Anônimo disse...

pretty nice blog, following :)