Este é meu sétimo texto pra o blog. No inicio eu pensava que seria um espaço para trocar experiências sobre viagens na Europa, e ai foi invergando para um lado, caindo para outro, muitas vezes se aproximando mais da poesia do que relato e prosa. E cá chegamos, completando dois meses de vida da coluna. Como a justiça brasileira, meus textos tardam e falham no objetivo, porém recepcionados por agradáveis feedbacks. Tantos que resolvi comentar alguns assuntos mais distantes da rotina de um viajante, embora bem nítidos para quem resolve permanecer por mais tempo em um lugar.
Sim, a crise internacional chegou na Europa já faz tempo, desde que Bin Laden cultivava sua barba exótica e Obama era um idealista democráta. Hoje, que o criminoso está alguns palmos debaixo da terra e nosso alegre presidente americano já mostrou ser mais do mesmo, já podemos observar com mais clareza esta crise de proporções estruturais. Eu não colocaria minha mão no fogo pela veracidade de uma crise numa base que se mostrava tão sólida como a Europa, se, o fato crucial de eu morar por aqui não me jogasse no lugar de expectador compulsório deste colapso. Nos jornais não se fala de outra coisa. As noticias desanimadoras estão espalhadas por todo canto, desemprego, falências, baixos salários e impostos engolindo impostos. Pela televisão a gente repara a voz monocórdica lusitana dos apresentadores anunciando mais cortes, quedas das expectativas econômicas e as esperanças populares esmiuçadas a cada plano novo do governo.
Na última quinta-feira a Europa se mobilizou. Uma greve geral paralisou os trânsitos das maiores capitais, parou escolas e comércios, e tudo isto acompanhado por manifestações nos maiores centros de Paris, Itália, Espanha. No entanto, há pouca reflexão do senso comum do que este colapso representa. Aqui em Coimbra pairava uma aura de feriadão, alguns alunos estimulados pela falta de aula e muita gente acreditando que era um dia de comemoração... mas me diga comemoração do que? Da crise? É absurdo e trágico como a peça Hamlet de Shakespeare. A reflexão de que aquele era um dia de luto, de revolução era substituido por um defeito colateral que atinge todo ser humano, a hipocrisia. Este sentimento, universal, faz a gente acreditar que tudo está bem, até que ninguém mexa em nosso queijo. Só aí a trama se adensa e tomamos o real sentido da greve, a Europa sente, enfim, a necessidade de se reinventar.
Acabaram já há muito o tempo da grandes navegações. Por mais condecorador ou triste que sejam o passado destes paises, uma certeza é clara. O mundo mudou. E a Europa, ocultada nesta grande parede de gesso que é a União Européia, vai ter que abrir suas portas. Ou vê-las raxar ao meio. Não dá mais pra se ancorar nas velhas conquistas, na busca fácil por novos horizontes a colonizar. O mundo se acostuma, aos poucos, com o que chamamos de liberdade. O periodo malicioso das colónias se agravou e está a beira do seu fim. Não vou discutir culturas e democracias, mas a liberdade e a independência, no seus sentidos mais amplos, já são um objetivo mundial. A Grécia já percebeu isto, o oriente médio também. A Europa, implacavelmente, está sentindo o ruído, se não amplamente, decerto no seu horizonte econômico, por ora embaçado. E nem a tecnologia pode nos salvar facilmente.
Vivemos uma época de fantásticas descobertas tecnológicas, só nos falta reinventar a roda, mas ainda cultuamos uma cultura de monarquias e impérios. Disfarçados pelas mínimas aparições da rainha da Inglaterra se esconde a inconsciente vontade de diluir este mimo cultural. Desde que aprendi a ler, vejo estampado nos jornais o desfalque que manter uma cultura de luxos aparentes, uma rainha, um rei, que seja, provoca nestes novos tempos. É como se ainda vivêssemos nos tempos do príncipe dinarmaquês. Onde o culto a parafernalha, aos tronos e as glórias, preservassem o prestigio de um país. Não acho que hoje se mede o sucesso de um pais pelo tamanho de sua realeza, pelo contrário, me parece uma ideia absoleta. Podemos calcular a vitória de uma nação pelos cuidados que esta prestam aos seus cidadãos. Pois então o que sugere esta nova onda de suicidios na Espanha desde a nova lei de Despejos? Uma realidade brutalmente desumana. Impensável forjar uma ameaça como esta, a de doar a própria vida ao ver despedaçados os planos de moradia em um país que lhe abrigava. Este pra mim é o retrato da crise na europa, uma crise, não só de dinheiro, mas de costumes. Não dá pra ignorar estes sintomas. Nem mesmo eu que poderia estar simplesmente experimentando as benventuras de uma viagem a Europa posso ficar indiferente.
E pra quê melhor reinvenção do que os rumos que a Espanha e Portugal estão tomando? As últimas noticias são de votos espanhois para que a América Latina aceite alianças. O Brasil, já a algum tempo, faz parte da principal maneira de espape da população portuguesa. E com razão e legítimamente. Os investimentos espanhois no Brasil nunca obtiveram niveis tão altos. É tempo de colonizados e colonizadores dispacharem este passado e emplacarem a nova maneira de relação internacional, ancorada na diplomacia e na igualdade de poderio. E isto é sinal de maturidade. A história está sendo feita ao vivo.
Até mais.
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