Texto 1: Horizontes Baianos: minha turnê de despedida


O exterior de uma mala é escura e opaca até que se preencha de vida e cor com as bagagens do viajante. O viajante é a luminosidade dos destinos. Cada mochileiro carrega consigo a história de seus caminhos, os prazeres que buscou em cada porto, os encantos que experimentou percorrendo com ousadia, atenção e espanto cada país, região, lugar.

Minha história de viagem começa antes do trem partir e do vôo decolar. Começa nos últimos momentos que passei no Brasil, o céu baiano no horizonte cada vez mais distante e o sol tropical banhando uma saudade antecipada deste meu pais amarelo, azul e verde. E então que faltando alguns dias pra partir, o azul singularmente delicado do céu ficava cada vez mais azul e as noites, sejam elas as litorâneas de Itacaré, as sertanejas de Feira de Santana, as gélidas e vaporizadas de Vitória da Conquista ou as familiares e cálidas de Jequié, todas elas estiveram mais ardentes e graciosas nestes últimos segundos silvestres.

Pondo silenciosamente as roupas na mala, que não pode exceder os 32 Kg habituais das companhias aéreas, me flagro em um ritual cigano. Em algumas culturas, a pessoa que viaja leva consigo, impregnado nos tecidos corporais, a essência e fragrância de quem deixou em terra firme. Neste momento me surpreendo esfregando nos panos, não os perfumes industriais, mas sim as lágrimas mais íntimas de cada pessoa que amo, e que ficarão no Brasil, sem mim.

Experimento esta saudade dolorosa, porém feliz e consciente, de quem nunca atravessou um oceano, nem o menor deles, e de quem cumpriu com paixão e amizade os últimos 22 anos de sua vida, unindo laços fraternos, aplacando amores de todas as ordens, exaltando a companhia e a cumplicidade das pessoas cujo carinho me vestira e me blindara.

Embarco nesta jornada rumo a Europa inundado de histórias, algumas vividas, outras felizmente recolhidas em minhas peregrinações baianas, traços particulares dos amigos que deixo no Brasil, mas que ao mesmo tempo refugio no interior de minha mala. Levarei belas lembranças que ganhei antes de partir. A Yolanda me escreveu bonitezas inesquecíveis, cumplicidades inenarráveis tatuadas em sua almofada consoladora, me desejando uma jornada breve, posto que a falta de quem parte é uma chaga aberta, ainda que curável. Alana, minha doce tchu, espatifou este coração em dois, fez dele abrigo e me presenteou com um DVD que resume minha alma, Sociedade dos Poetas Mortos, um delírio cinematográfico sobre a liberdade. A mim, que nunca desviei de meu destino cosmopolita, cidadão do mundo, resta organizar os versos e símbolos das pessoas cuja estima confesso, grito e choro nesta pátria que me albergou.

Junto com roupas e livros, levo cada coração brasileiro, em meio as fitas do Bonfim, a bandana de Bob Marley que ganhei numa manhã insone de Itacaré quando o salgado das lágrimas se unia ao sal do mar nordestino. Carrego aromas das terras tupiniquins, as cores quentes dos baianos, o barulho furioso dos tambores, dos violões chorosos, das guitarras elétricas delirantes. Tudo que representa o nosso Brasil, vasto e diverso, único e explícito, migrará comigo nas memórias e palavras para os terrenos lusitanos.

Em Portugal, serei porta-voz vivo das alegrias brasileiras. As dores do Brasil, que doem desde antes quando Cabral assentou os pés em nossas terras, não se estancarão nos próximos meses, embora, em mim não haverá espaço para elas. Só haverá música e poesia, amor e gratidão.  Esperem relatos sinceros de um viajante. Aguardem impressões dos países que eu visitar, do idioma, cultura – rastros sanguíneos de outros povos. Me desejem sorte!

Quem quiser continuar acompanhando clica abaixo.


Exclusivamente para quem quiser acompanhar esta jornada até Coimbra, criei este espaço com fotos, videos criados pelo aplicativo Trip Wow, que acabarei usando bastante nas viagens pela Europa.

Segue um video da turnê pela Bahia que fiz estas duas últimas semanas, reunindo foto dos amigos e dos lugares. A viagem pra Coimbra será na próxima semana. Logo o texto que virá abordará as despedidas e o longo percurso de atravessar o oceano e aportar nas terras lusitanas. Amigos e amigas, leitores e leitoras deste blog, embarquem comigo. Apertem os cintos. Próxima parada: COIMBRA!!






1 comentários:

Alana disse...

Boa sorte, meu tchu!!! E eu, inocente, que esperava um relato corriqueiro de viajante, ainda me surpreendo ao me deparar com essa literatura típica sua, risos. Começou com o pé direito, tchu, mal posso esperar pelos próximos capítulos desse livro que você tá escrevendo, na vida e no diário. :)